Nos anos 90, poucos veículos tinham tanto poder sobre a música quanto a televisão. Bastava uma canção entrar na trilha de uma novela para deixar de ser apenas um hit de pista e virar parte da vida de milhões de pessoas. Era o poder dos meios de massa: a música ganhava visibilidade nacional, se fixava na memória afetiva do público e, muitas vezes, decidia o rumo de uma carreira inteira. Hoje o jogo mudou — vivemos na era do streaming, das redes sociais e dos algoritmos, em que cada um monta sua própria trilha sonora e os hits estouram em playlists, virais de TikTok ou vídeos que circulam de celular em celular. Mas, lá atrás, o caminho era outro: estar em uma novela significava ter uma chance única de chegar a todos os cantos do país de uma vez só.

Foi exatamente isso que aconteceu com “Follow You (Crazy for You)”, do SECT, que entrou para a trilha de História de Amor, da TV Globo, e transformou o grupo em um dos grandes nomes da dance music brasileira.

O SECT nasceu em 1994, formado pelos irmãos produtores Jorge “Tchorta” Boratto e Gui Boratto, junto com a vocalista Patrícia Coelho. A proposta era ousada: criar eurodance brasileiro com qualidade internacional. As primeiras gravações foram feitas em estúdio improvisado, mas já revelavam a essência do trio — batidas eletrônicas, refrões em inglês e uma estética sombria que ajudava a marcar presença.

Gui Boratto

O ponto de virada veio justamente com “Follow You”. A faixa já agitava clubes e rádios, mas quando entrou como tema geral da novela História de Amor, o impacto foi imediato. A música aparecia em diferentes momentos da trama, estava na coletânea internacional da novela — uma das mais vendidas do horário — e ainda tinha um detalhe simbólico: era o único representante brasileiro ao lado de produções estrangeiras. Essa exposição em rede nacional transformou “Follow You” em fenômeno, levando o SECT a um público que talvez nunca tivesse contato com o eletrônico de pista.

Jorge Boratto

O efeito foi múltiplo: ampliou o alcance, criou memórias afetivas ligadas à novela, deu credibilidade mainstream a um projeto de eurodance em inglês feito no Brasil e impulsionou vendas, execuções em rádio e presença em coletâneas. De quebra, abriu espaço para que outros singles como Wasting My Life e Get Away também conquistassem o público.

O álbum Eleven, lançado em 1995, consolidou a fase de maior sucesso do grupo com faixas que se tornaram clássicos, enquanto a estética visual, marcada por figurinos de Alexandre Herchcovitch, reforçava a aura “dark” e teatral. Apesar da curta trajetória — Patrícia deixou a banda em 1998 —, o impacto cultural já estava feito.

Patrícia Coelho

Décadas depois, a nostalgia falou mais alto. Em 2022, Patrícia regravou Follow You em nova roupagem, e em 2025 o grupo lançou nova versão de I Can’t Stop Loving You, prova de que o legado do SECT continua vivo. Hoje, a banda é lembrada como um dos primeiros projetos brasileiros de eurodance a conquistar sucesso nacional. Mais do que nostalgia, representa uma parte fundamental da identidade da dance music no Brasil — e um exemplo claro de como, nos anos 90, o poder da novela podia transformar uma música de pista em trilha da vida de uma geração.

Para DJs e produtores, a mensagem é clara: não basta criar uma boa faixa — é preciso pensar em como ela pode circular, onde ela pode ser ouvida e de que forma pode se conectar com o público em momentos de emoção e memória. O sucesso nasce da soma entre criatividade artística e estratégia de difusão. O SECT provou isso no passado; agora, cabe à nova geração encontrar os seus próprios “veículos de massa” para transformar músicas em experiências coletivas.

*Co produção Cássio Souza.